Aula na EPM debate ascensão da pessoa ao plano do Direito Internacional

A construção do conceito de personalidade no plano do Direito Internacional foi o tema analisado hoje (15) no curso Temas Controvertidos dos Direitos Humanos da EPM. A aula foi ministrada pelo professor Guilherme Assis de Almeida e teve a participação da juíza Camila de Jesus Mello Gonçalves, coordenadora do curso e da área de Filosofia e Direitos Humanos da EPM.

 

“Temos direitos pelo fato de sermos pessoas”, afirmou o professor no início de sua preleção. Em seguida, ensinou que os cinco princípios constitucionais fundamentais, definidos como a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político, estão vinculados ao conceito de pessoa, que surge com a Revolução Francesa. Esclareceu que antes dela só havia o conceito jurídico de indivíduo.

 

Adiante, comentou sobre a linha de pensamento dos direitos humanos como “religião da humanidade”, ressaltando a figura do sociólogo francês Émile Durkheim (1858–1917), autor de As formas elementares de vida religiosa (1912). Nesta obra, o referido pensador estabeleceu relações entre a norma moral e a norma jurídica para a construção da solidariedade entre pessoas e coesão social.

 

O professor estendeu sua análise à noção de sacralidade da pessoa, transferida da esfera religiosa para o domínio moral, desenvolvido pelo teórico francês na perspectiva e possibilidade da auto-transcendência. “O que se espera no mundo contemporâneo é a sensibilidade inteligente para perceber a dimensão do valor da pessoa”, afirmou. Neste diapasão, o palestrante também discorreu sobre a obra do filósofo alemão Rudolf Otto (1869–1937), que tratou do conceito numinoso, uma abstração do que há de racional e irracional na ideia de Deus.

 

Na perspectiva da conquista dos direitos humanos, ensinou que, antes do século XVIII, a tortura era vista como um meio de prova no campo do Direito. E ressaltou o que considera os dois principais marcos da ascensão dos direitos da pessoa: a publicação da obra Dos delitos e das penas, do italiano Cesare Beccaria (1738–1794), e o início da luta no campo intelectual e político contra o tráfico de escravos.

 

Para Guilherme Assis de Almeida, “a percepção plena da dignidade da pessoa humana data do fim da escravidão, com o estabelecimento de contratos de trabalho, em que a relação com o trabalhador deixa de ser objetal”. Contudo, a título de curiosidade, evocou a origem da expressão “para inglês ver”, cuja origem é a assinatura do tratado entre Brasil e Inglaterra para a proibição do tráfico de escravos, em 1926, acordo que só seria cumprido 24 anos depois, em 1850, com a assinatura de uma lei mais rígida, pelo então ministro da Justiça, Eusébio de Queirós. E apontou a reincidência do trabalho escravo no país, realizado por imigrantes, na indústria têxtil informal.

 

Adiante, discorreu sobre a história recente das graves violações à integridade e aos direitos da pessoa humana, perpetrados pelos regimes totalitários e pelas guerras, e sobre a criação dos institutos jurídicos e dos órgãos internacionais de proteção aos direitos humanos, em reação, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a Convenção para Prevenção e Repressão do Genocídio, ambas de 1948.

 

Segundo o palestrante, a principal diferença entre os princípios protetivos da Revolução Francesa e a Declaração Universal dos Direitos do Homem é que, a partir da redação desta última, a tarefa de proteção da pessoa passa a ser também do Direito Internacional. “A partir desses dispositivos, a guerra deixou de ser uma forma jurídica de resolução de conflitos. O Direito, na perspectiva internacional, passou a ser um instrumento de promoção da paz entre indivíduos e estados nacionais”, ponderou.

 

O professor discorreu, ainda, sobre a construção do conceito de valor. Sob este aspecto, mencionou a contribuição do jurista Miguel Reale, autor da teoria tridimensional do Direito.

 

A seguir, relatou casos em que atuou como entrevistador no Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR-Brasil), órgão criado em 1950 para proteger e prestar assistência às vítimas de conflitos armados, violência generalizada, perseguições religiosas ou por motivo de nacionalidade, raça, grupo social e opinião pública, que já ajudou mais de 50 milhões de pessoas no mundo a encontrar um novo lar e reconstruir suas vidas.

 

Guilherme Assis de Almeida encerrou a palestra com comentários sobre a mudança de perspectiva de proteção de direitos humanos na Constituição Federal brasileira, cujo resultado prático e exemplar, em seu entendimento, é a promulgação da Lei Maria da Penha.

ES (texto e foto)

 


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