Controle jurisdicional e responsabilidade do Estado por políticas públicas de educação são tema de aula na EPM

As relações entre educação, desenvolvimento da personalidade e emancipação do indivíduo foram tratadas pela professora Maria Garcia (foto), no último dia 26, em aula do curso Controle jurisdicional das políticas públicas e responsabilidade do Estado da EPM. A aula teve a participação do desembargador Paulo Magalhães da Costa Coelho, coordenador do curso e da área de Direito Público da Escola.

 

Inicialmente, Maria Garcia valeu-se de dois conceitos de políticas públicas para uma síntese do tema. O primeiro, do filósofo Hugo Assmann, que o define como “metas coletivas conscientes”; o segundo, da professora Maria Paula Dallari, que diz que “são medidas indicativas de diretrizes de ação do Estado numa área determinada, portanto relativas à administração da polis, da cidade, do Estado”. Em sua síntese, a palestrante asseverou que “políticas públicas são programas de ação, destinados a realizar, sejam os direitos a prestações, a medidas organizacionais ou normas e procedimentos necessários para atingir as metas, objetivos e finalidades do Estado”.

 

Adiante, observou que até nos países desenvolvidos os recursos são inferiores às necessidades emergentes das coletividades. “Daí a necessidade do estabelecimento de prioridades pelo governo, cujo dever é dizer com clareza e honestidade, desde logo, a quais vai atender, e convidar a sociedade a participar democraticamente dos processos de implementação”.


Retomando a definição de Assmann, a professora deteve-se no termo “consciência”, apontando sua dimensão moral de conhecimento do bem e do mal. Ela asseverou que a consciência, aplicada à ação dos governos na implementação de suas políticas públicas, implica no conhecimento das consequências, dos resultados previsíveis da tomada de decisão, na responsabilidade dos governantes, em suma. Discorreu ainda sobre a “ética da responsabilidade”, de Max Weber, que se traduz como a responsabilidade que todos têm pelos resultados previsíveis de seus atos, inclusive o Estado, na busca da promoção do bem comum.

 

A professora salientou a importância do planejamento estratégico na implementação das políticas públicas. “Nós sabemos que planejamento é uma forma de governar, uma medida oriunda da ideologia socialista, que acabou sendo adotada no resto do mundo. E a nossa Constituição fala de planejamento indicativo do Estado, de seu dever de convidar e dar estímulos fiscais às empresas para que participem do planejamento e da busca da meta estatal”, ensinou.

 

A educação como ferramenta da realização do indivíduo

 

Em prosseguimento, a palestrante trouxe para o debate a definição da finalidade constitucional do Estado, qual seja, a promoção do bem estar ou bem comum, formulada pelo jurista Dalmo de Abreu Dallari como “o conjunto de condições sociais para permitir e estimular o desenvolvimento integral da personalidade humana”. Ela enfatizou que, sem esse norte, não valeria a pena manter uma estrutura pesada e cara do Estado, geralmente voltada para si mesma e acima da cidadania.

 

Maria Garcia asseverou que, para atingir o pleno desenvolvimento da personalidade humana, um instrumento poderoso é a educação, o acesso ao conhecimento. E esclareceu que, “embora a Constituição empregue indistintamente educar e ensinar, ensinar é transmitir informações, ao passo que educar é orientar e conduzir, levar as pessoas a uma meta, a um ideal, a uma finalidade, que consiste justamente no desenvolvimento integral da pessoa, preconizado no artigo 205 da Constituição Federal”.

 

Nesta perspectiva, a educação tem a função mediadora do atingimento dos objetivos constitucionais fundamentais, pela emancipação da miséria material pelo trabalho e pela profissionalização, e da penúria moral, pela plena realização da personalidade humana. Em última instância, “a educação, é o único caminho para atender ao artigo 3º da CF, que preconiza uma sociedade livre, justa e solidária. O Estado (soberano) precisa ser educado pois queremos cidadãos livres e não apenas súditos”, proclamou Maria Garcia.

 

Dentre os programas de ação do Estado brasileiro voltados para os objetivos constitucionais na área da educação, Maria Garcia citou os fundos Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) e o Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental).

 

A professora falou dos problemas para a garantia dos direitos constitucionais sociais assegurados no artigo 6º da CF, tendo comentado que o principal deles não é a falta de recursos, como se costuma alegar, pois estes existem em abundância, mas a falta de gestão.

 

Os rumos da responsabilidade civil extracontratual do Estado

 

A palestrante discorreu, finalmente, sobre a responsabilização do Estado pela promoção do bem estar comum e dos danos causados ao indivíduo ou à coletividade por ação ou omissão, bem como sobre o controle jurisdicional das políticas públicas.

 

Ela salientou, inicialmente, a equiparação dos Poderes na república.  Afirmou que o Poder Judiciário deve se manifestar na concretização ou na ameaça a direitos humanos apenas quando o Legislativo e o Executivo não cumprirem essa função. Neste sentido, fez restrições à atuação do Judiciário em certas atividades ou situações, nas quais, em seu entendimento, não deveria se manifestar. Para ilustrar, citou a autorização do STF para aborto de bebês anencéfalos.

 

Maria Garcia frisou, por outro lado, que a responsabilização do Estado, prevista no artigo 37, parágrafo 6º da CF, não se deve apenas diante de fatos ocorridos, mas implica também no dever de atuar na ação preventiva. Ela comentou a esse respeito, o caso das crianças que morreram em decorrência de ingestão de comida coletada em um lixão em Catende (PE). “Diante dos desafios impostos ao Estado em uma sociedade de risco complexa, em que as tecnologias avançaram tremendamente, como é o caso da biotecnologia, a responsabilidade do Estado precisa ser revista. Ele passa a ser responsável não apenas pelos danos que possam ser causados pelos seus funcionários, não previsíveis há alguns anos, como também vai ser levado a estabelecer ações preventivas para evitá-los. O Estado visará assegurar e não apenas reparar”, ponderou.

 

A palestrante concluiu sua exposição reafirmando a necessidade de educar o cidadão, educar os governos, educar o soberano a administrar a coisa pública, cumprindo a Constituição e as leis. “Evidentemente, um caminho longo e difícil, mas o caminho se faz ao caminhar, já dizia o poeta espanhol Antonio Machado. E acrescentou, do músico Geraldo Vandré, os versos ‘Vem vamos embora, que esperar não é saber. Quem sabe faz a hora; não espera acontecer’. Essa a disposição que se espera hoje do Estado brasileiro. Para isso, deverá haver uma revolução cultural”.

 

ES (texto e foto)

 

 

 

 

 

 

 


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