Maria Berenice Dias discute adoção no curso “Temas controvertidos de Direito de Família e Sucessões”

Os aspectos legais da adoção de crianças e da alternativa da reprodução assistida foram analisados, no último dia 19, pela advogada Maria Berenice Dias, ex-desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam) no curso de extensão universitária Temas controvertidos de Direito de Família e Sucessões da EPM. A aula contou com a participação da juíza Flávia Poyares Miranda, coordenadora do curso e da área de Direito de Família e Sucessões da Escola.

 

A palestrante iniciou a preleção com a rememoração de suas lutas e engajamento no âmbito judiciário para o reconhecimento dos direitos da família extramatrimonial, dos filhos havidos fora do casamento e das uniões homoafetivas. “Criei a expressão “homoafetividade” para tirar o peso do preconceito gerador do sentimento de repugnância ante as uniões homossexuais e para fazer valer a noção do vínculo afetivo como elemento central da família e da eticidade que deve preservá-la”, disse.

 

Ela também destacou a atuação decisiva da classe dos advogados na articulação de grupos para capacitação para atuar em defesa desse segmento da sociedade e na reivindicação de leis específicas em seu benefício. “Foram eles que bateram às portas do Judiciário e elaboraram o Estatuto da Diversidade Sexual, um projeto que reúne princípios e normas de Direito material, como a criminalização da homofobia, e propõe políticas públicas para a efetividade desses direitos. O texto traz duas emendas constitucionais, ora em trâmite no Senado”.

 

Adentrando a seara normativa e administrativa da adoção (Lei  12.010/2009), Maria Berenice Dias afirmou que “apesar dos esforços do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Estado não está cumprindo a Constituição, que preconiza a prioridade absoluta no que tange à garantia  do direito à convivência familiar às crianças abrigadas.” Em relação ao texto da Lei de Adoção, asseverou que “em nenhum momento se respeita a autonomia da vontade das mulheres. Aliás, nós mulheres, nunca tivemos respeitada a autonomia da vontade, porque, na prática, a palavra do homem sempre vale mais que a da mulher”.

 

A realidade histórica do abandono infantil

 

Em prosseguimento – e como elemento de prova da historicidade do abandono infantil –, a palestrante lembrou personagens épicas, como o caso bíblico do hebreu Moisés e o caso mítico dos fundadores de Roma, Rômulo e Remo. Dentre as causas agravantes do abandono de crianças no Brasil, ela comentou a inexistência de políticas públicas no que concerne ao controle da natalidade, a proibição legal do aborto e a influência da religião, que condena o uso de métodos contraceptivos.

 

Entretanto, em que pese a proibição, ela sustentou que as práticas abortivas são uma realidade, cujos aspectos perversos não podem ser ignorados, e que o país não possui mecanismos efetivos para controlar ou coibir o aborto.

 

Adiante, Maria Berenice criticou o que considera excesso de zelo e  leitura estatal equivocada da lei, quando seus agentes  insistem em convencer a mãe ou familiares a ficar com uma criança que já foi repudiada. “De nada serve a manifestação de vontade das mulheres, porque os diversos órgãos do sistema estatal agem para convencê-la da necessidade de ter a criança e mantê-la”.

 

De acordo com a palestrante, para a correções das distorções, é preciso tirar o foco do direito da família biológica e colocá-lo no direito da criança, que precisa de um lar e de alguém que a ame. “Que interesse estamos privilegiando quando deixamos uma criança no abrigo e ficamos tentando fazer com que a mãe biológica faça tratamentos de desintoxicação ou dependência química, ou arranje emprego, ou casa, quando há gente esperando há anos para ter um filho para amar e cuidar?”, indagou. Em seu entendimento, diante dos entraves à adoção, cujo cadastro exige o preenchimento de oito requisitos, o Brasil deveria ter um sistema que respeitasse a autonomia da vontade da mãe e entregasse a criança imediatamente ao primeiro da lista de adoção.

 

Como alternativa à adoção, Maria Berenice Dias comentou a possibilidade da reprodução assistida, disponível a todos, inclusive aos homossexuais. De acordo com ela, a última resolução do Conselho Federal de Medicina acabou por reconhecer expressamente a possibilidade do uso dessas técnicas. Mas em nome da responsabilidade social e da efetividade do sistema jurídico que regula a adoção, a professora declarou não ser contra as técnicas reprodutivas. “Só que, enquanto alguém faz um filho, sobra uma criança no abrigo”, ponderou.

 

ES (texto e foto)

 

 


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