Temas controvertidos de Direito Bancário são debatidos em novo curso

Com a aula “Princípios gerais do Direito Contratual e do Direito Bancário”, ministrada pelo desembargador Francisco Eduardo Loureiro, conselheiro e tesoureiro da EPM, teve início, no último dia 25, o curso Temas controvertidos de Direito Bancário. A aula inaugural teve a participação do desembargador Sérgio Seiji Shimura, que coordena o curso, juntamente com o desembargador Itamar Gaino.

 

Ao iniciar sua exposição, Francisco Loureiro citou o jurista Michele Giorgiani, segundo o qual o Direito Privado, especialmente o Contratual, representa a “última praia” para a autonomia da vontade, em que as partes podem construir suas razões jurídicas, porque nos demais ramos havia uma grande interferência estatal. “Michele Giorgiani avisou que essa ‘praia’ diminuía dia a dia, porque os ordenamentos jurídicos contemporâneos estavam retirando espaço da autonomia privada e, cada vez mais, interferindo na esfera contratual, dizendo o que podia e o que não podia, como deveria e como não deveria ser contratado. Ou seja, o Direito Privado tinha seus dias contados como um amplo espaço da liberdade, cedendo cada vez mais lugar a uma crescente interferência contratual”.

 

O palestrante ressaltou que há uma importância crescente dos contratos bancários nas relações de massa. “Isso gerou e gera, assim como no direito Privado em geral, o que se chama de Direito pós-moderno, marcado pela complexidade da relação jurídicas e multiplicidade de regras e estatutos para regerem as mais diversas situações”. Nesse contexto, lembrou que houve uma evolução do sistema fechado para o sistema aberto, do Código Civil de 2002, “um sistema principiológico em que o mundo contratual é controlado por princípios cogentes que informam os contratos, que mudaram radicalmente a visão do juiz sobre o contrato, que passou a interferir nele, caso alguma cláusula fira determinado princípio do Direito comum ou do Código de Defesa do Consumidor”.

 

Em relação ao regime jurídico dos contratos bancários, salientou que, além da multiplicidade de leis do Direito comum, eles também são regidos pelo CDC, porque há uma norma expressa (artigo 3º, parágrafo 2º), que estabelece que o CDC abrange as atividades de natureza bancária, financeira e de crédito e securitária, salvo as de caráter trabalhistas. “Os contratos bancários podem estar e frequentemente estarão enquadrados como relação de consumo, ainda que o contratante seja pessoa jurídica e não pessoa natural”, observou.

 

Loureiro explicou que as pessoas jurídicas também serão consideradas consumidoras em sentido jurídico se for comprovada sua vulnerabilidade ou hipossuficiência no caso concreto. “Nada impede que uma pessoa jurídica que tome empréstimo em um banco, ainda que seja para financiar uma máquina, fomentar sua atividade empresarial ou pagar seus empregadas, seja qualificada como consumidora e receba a proteção do CDC”. Entretanto, lembrou que nem sempre haverá essa vulnerabilidade, como no caso de empresas de grande porte, quando a relação jurídica será de Direito Empresarial.

 

A seguir, explicou que o Código Civil e o CDC são complementares, havendo um diálogo entre eles, com base no artigo 7º do CDC, que estabelece que os direitos previstos não excluem outros decorrentes de tratados e convenções ou da legislação interna ordinária. Ele acrescentou que, se o CDC não tiver mecanismos suficientes, podem ser utilizados mecanismos do Código Civil ou de outra legislação extravagante para garantir uma posição de supremacia do consumidor. “A ideia do diálogo das fontes é que não tem cabimento que, em um sistema protetivo como é o CDC, o consumidor tenha menos proteção do que em um sistema de Direito comum, paritário como é o Código Civil. Se ele encontrar menos proteção no CDC, nada impede que ele busque mude de regime jurídico”, frisou.

 

Nesse contexto, mencionou a conceituação de Claudia Lima Marques para o diálogo entre o CDC e o CC, que preconiza três tipos: diálogo sistemático de coerência, porque o CDC toma de empréstimo as definições do CC e lhes dá novas regras; de complementaridade, porque, muitas vezes o CDC é aplicado de forma complementar ou subsidiária ao CC; e o diálogo de coordenação ou adaptação sistemática, segundo o qual é possível, em determinados casos, transpor reflexões doutrinárias e posições jurisprudências de um código para o outro. “Há uma porta aberta entre os dois sistemas, para que eu eventualmente use regras de um ou de outro para tirar do produto final o regime mais protetivo do consumidor”.

 

Princípios do Direito Contratual e Bancário

 

Na sequência, Loureiro esclareceu que os princípios que regem o Direito Bancário são os mesmos que regem os contratos em geral: a autonomia da vontade ou, como se denomina atualmente, a autonomia privada, que é o direito das partes de construírem suas relações jurídicas; a obrigatoriedade ou pacta sunt servanda, que determina que não cabe arrependimento, salvo se a lei permitir; e a boa-fé objetiva.

 

Ele conceituou o princípio da boa-fé objetiva como “um padrão de comportamento ou conduta exigido das partes, de modo a não frustrar a confiança ou a legítima expectativa despertada na parte contrária”. E ressaltou que a boa-fé objetiva está presente desde a fase pré-contratual e projeta-se além do contrato, na fase pós-contratual, ponderando que ela é mais severa no CDC.

 

Citou também, as três funções da boa-fé objetiva: a interpretativa, ao ser utilizada para determinar o alcance ou o sentido de uma cláusula contratual, com base na justa expectativa da parte; integrativa, ao criar deveres que as partes devem cumprir, ainda que não previstas expressamente no contrato; e a de controle, que tem a função de evitar o abuso de direito.

 

Loureiro discorreu ainda sobre o princípio da intangibilidade, que decorre da autonomia privada e da força obrigatória dos contratos, que nascem da vontade e têm como elemento fundamental o consentimento. “O juiz pode integrar o contrato e criar regras que as partes não convencionaram? A princípio, digo que não. A integração contratual deve ser feita com muita cautela, porque o juiz não pode substituir a vontade das partes pela sua, criando cláusulas contratuais. Ele pode sim invalidar determinadas cláusulas se entender que são abusivas, no regime do CDC, ou que ferem normas cogentes, no regime do CC”, ressaltou.


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