Corrupção e sistema penal eleitoral são discutidos no curso ‘Temas atuais de Direito Penal’

O advogado Fernando Gaspar Neisser, presidente da Comissão Permanente de Estudos em Direito Político e Eleitoral e diretor de Relações Institucionais do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), foi o palestrante da aula do último dia 20 do curso de extensão universitária Temas atuais de Direito Penal, que versou sobre o tema “Corrupção e o sistema penal eleitoral”. A exposição teve a participação do desembargador Francisco José Galvão Bruno e do juiz Ulisses Augusto Pascolati Júnior, coordenadores do curso e da área de Direito Penal da EPM.

 

A propósito do tema da corrupção na esfera da atividade política, Fernando Neisser lembrou preliminarmente a célebre frase do político e historiador inglês John Emerich Edward Dalberg-Acton, conhecido como Lorde Acton: “o poder tende a corromper; o poder absoluto corrompe de maneira absoluta". Para o palestrante, o ser humano apega-se tanto ao poder que é quase impossível separá-lo de quem o exerce, e permite, quando existe essa intenção, o aproveitamento para a realização de atos corruptos de toda espécie.

 

Uma vez identificado o cerne do problema, ele comentou que, ironicamente, é no momento em que existe uma chance de se perder o poder ou de acessá-lo, que a democracia mais se fragiliza. “É justo no momento em que se comemora o símbolo da democracia, as eleições, que incide a sua maior fragilidade, pois é nesse momento que a máquina pública e os recursos financeiros podem ser usados em detrimento da vontade do eleitor”.

 

De acordo com o expositor, toda tentativa de definição jurídica da corrupção esbarra em problemas, mostrando-se insuficiente ou exagerada. E asseverou que essa dificuldade do Direito em dialogar com o conceito de corrupção nasce do fato deste ser um conceito quase intuitivo. “Por ter esse fundamento pré-iluminista, a corrupção dialoga pouco com os conceitos modernos de tipicidade e de estrita legalidade, e é um desafio para os juristas lidarem com esse conceito em razão dessa dificuldade”, explicou.

 

Nesta perspectiva, o professor entendeu pouco proveitosa a limitação do espectro da análise àquilo que é conhecido pelo nome de corrupção eleitoral ou compra de votos, um crime previsto no artigo 299 do Código Eleitoral. Fernando Neisser ampliou a análise para o conceito não jurídico ou mais sociológico de corrupção, “fenômeno multifacetado e determinável em termos de condutas consubstanciadas em uma troca, na qual a prestação  envolve, de um lado, um benefício privado (pecuniário ou não) e, de outro, o desvio na consecução de uma política pública, direta ou indiretamente. “Noutras palavras, o ‘toma-lá-dá-cá’, que tangencia o discurso jurídico mas não se identifica com ele”, observou.

 

Sob o prisma da tipificação penal, ele comentou as formas como o Direito Eleitoral responde ao fenômeno da corrupção, ou quais armas jurídicas ele possui para tentar fazer o enfrentamento e coibir as práticas nocivas ao sistema. Nesse sentido, para o palestrante, o Código Eleitoral, datado de 1965, está absolutamente defasado como ferramenta normativa, embora traga uma miríade de mais de 70 tipos penais eleitorais.

 

“O Código Eleitoral traz uma disparidade de proteção a bens jurídicos. Se por um lado tem uma superproteção para tipos penais absolutamente irrelevantes, como o absurdo crime de furar a fila das eleições, deixa a desejar, por outro lado, naquilo que importa para um controle mais amplo da corrupção, como o crime de uso da máquina pública em benefício de uma campanha, com a pena mínima de 15 dias de detenção”, reparou o palestrante.

 

Diante desse quadro, ele defendeu a premência da reforma do sistema, mencionando a tramitação do anteprojeto do Código Penal. De acordo com Fernando Neisser, o texto logrou reduzir os mais de 80 crimes eleitorais previstos no Código Penal e em legislações esparsas para aproximadamente uma dúzia de tipos penais, adequando de forma proporcional as sanções à gravidade de algumas condutas com déficit de incriminação.

 

Entre as diversas formas nas quais a corrupção pode ter alguma influência sobre as eleições, ele mencionou o desvio da máquina pública em prol de uma candidatura, “um dos pontos em que a legislação penal eleitoral é mais falha, com previsão de detenção de 15 dias a seis meses”. Também comentou a corrupção no custeio das campanhas e na realização das despesas, o chamado caixa 2, debatido sob a égide do artigo 350 do Código Eleitoral, que prevê a falsidade ideológica eleitoral, tema que vem recebendo a máxima atenção, não só em função da operação Lava Jato, mas também de operações anteriormente deflagradas.

 

“Se esses atores do jogo das eleições – candidatos, partidos ou coligações – recebem recursos de outras fontes ou realizam despesas com esses recursos ou com outros e não informam a Justiça Eleitoral, o que se tem é um déficit de informação, que prejudica não só a isonomia, a paridade de armas, um dos valores mais caros tutelados pelo Direito Eleitoral, mas também atenta diretamente contra o direito que o eleitor tem de conhecer quem custeia as campanhas”, sustentou Fernando Neisser.

 

ES (texto)

 


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