Curso ‘Temas atuais sobre a recuperação judicial’ é concluído com debate sobre recuperação de grupos de empresas  

Cláudio Godoy e Maria Rita Rebello foram os expositores.

 

A aula “Recuperação de grupos de empresas e SPEs” encerrou ontem (20) a programação do curso Temas atuais sobre a recuperação judicial da EPM. O evento teve como palestrantes o desembargador Cláudio Luiz Bueno de Godoy e a juíza Maria Rita Rebello Pinho Dias e contou com a participação dos desembargadores Francisco Eduardo Loureiro, diretor da EPM; e Marcelo Fortes Barbosa Filho, coordenador da Área de Direito Empresarial da Escola e do curso.

 

Maria Rita Rebello iniciou as exposições explicando que a recuperação judicial de grupos de sociedades é um tema complexo que não está especificado na legislação. Ela esclareceu que há dois tipos de grupos de empresa: as de direito, organizadas por meio de convenção de grupo; e os grupos de fato. Nos grupos de direito as empresas disciplinam a forma de organização, gestão e administração entre elas e assumem a obrigação de buscar o interesse do grupo, sem que isso reflita em problemas de responsabilização de seus administradores ou controladores.

 

A palestrante ensinou que nos grupos de sociedades de fato, a formação do grupo é feita de maneira informal, por meio de participações recíprocas entre as sociedades. A organização do grupo é feita pelo poder de controle e por meio de participações recíprocas entre controladas, controladoras e coligadas.

 

Ela observou que nos dois casos não há previsão de afastamento ou desconsideração da personalidade jurídica de cada uma dessas empresas. pelo contrário, é mantida a separação patrimonial e a existência jurídica de cada uma delas. No caso do grupo de sociedades de fato, como o interesse do grupo não é formalizado por meio de um acordo, podem surgir conflitos entre os interesses do grupo e os interesses das sociedades individualmente consideradas, uma vez que os controladores, assim como os administradores, estão sujeitos aos deveres impostos pela lei.

 

Maria Rita Rebello destacou que a Lei de Falências e Recuperação Judicial (Lei 11.101/2005) não prevê como será feita a recuperação judicial de um grupo de empresas. Com relação à falência, a lei prevê a possibilidade de extensão dos efeitos da falência para administradores, controladores e também para sócios de responsabilidade limitada. No entanto, não há qualquer previsão para o caso de recuperação judicial. Ela ponderou que essa situação gera algumas dificuldades, porque existem muitos grupos de sociedades, sobretudo sociedades de fato em que há dificuldade em se identificar quais são as empresas que compõem esse grupo de sociedades, e a falta de clareza normativa pode colocar em risco até o objetivo final da própria lei, que é a reorganização da atividade empresarial.

 

Ela acrescentou que para contornar a falta de previsão normativa da questão, a jurisprudência tem recorrido ao instituto da consolidação tanto do concurso como das dívidas do grupo. E esclareceu que a unificação do procedimento de recuperação do grupo de empresas formal é denominada consolidação processual. A união dos ativos e passivos do grupo como um todo é considerada consolidação substancial.

 

A professora destacou que é plenamente defensável a possibilidade de litisconsórcio em pedido de recuperação judicial, cuja vantagem, além da economia processual, é permitir que a situação de crise do grupo seja apresentada de forma global, permitindo melhor visão sobre a situação financeira do grupo e, consequentemente, melhor condução do processo de reorganização empresarial, mitigando o risco de insucesso do instituto.

 

Ela citou pesquisa empírica do juiz Marcelo Barbosa Sacramone no sentido de que 42% dos procedimentos de recuperações judiciais deferidas atualmente constituem litisconsórcios ativos, o que indica a necessidade urgente de que haja algum tipo de disciplina legislativa sobre a questão. E que cerca de 76% das recuperações judicias em que há grupos de sociedades no polo ativo são formados por procedimento em que há consolidação substancial do concurso, ou seja, não apenas união formal, mas também das dívidas e obrigações do grupo.

 

Na sequência, Cláudio Godoy ressaltou que o assunto tratado é um dos temas polêmicos que envolvem a Lei de Recuperação e Falências. Ele fez ressalvas em enquadrar o grupo de sociedades como litisconsórcio, porque, na sua acepção, o litisconsórcio não é exatamente transportável para o processo de recuperação judicial, que é um processo coletivo com características próprias. Ele explicou que o litisconsórcio no processo civil abrange partes em polos próprios e trabalha-se com a análise fundamentalmente em tese. E ponderou que, enquanto na recuperação judicial há uma aproximação maior do que é o direito material para verificar a questão que, no fundo, é uma espécie de recuperação conjunta, o que nem sempre leva a uma consolidação substancial, mesmo que seja um só plano.

 

Ele explicou que pode haver consolidação processual numa recuperação conjunta de empresas mesmo com um plano único, até como uma forma de otimização de custo. E observou que se realiza uma só assembleia, elabora-se um só plano, mas na verdade, do ponto de vista instrumental, não do ponto de vista material, para os casos em que não há mistura de patrimônio e não há mistura de credores. “A questão é que hoje as empresas que pedem recuperação conjunta, não querem uma consolidação processual, querem uma consolidação substancial. Querem um plano unitário, em que haja consideração de patrimônios acrescidos e de credores acrescidos, todos considerados na inteireza dos créditos contra o grupo. E aí não só falta previsão legal, como não há solução perfeita, porque qualquer das duas soluções, permitir ou não permitir, traz vantagens e desvantagens”, asseverou.

 

O expositor lembrou que o grande argumento contra a consolidação substancial é a questão da mistura dos credores, com prejuízo para aqueles que originariamente eram credores de sociedades que possuíam melhor situação financeira e patrimonial e que em função da consolidação acabam respondendo pela dívida do grupo. No entanto, ponderou que o inverso também é verdadeiro, pois os demais credores contratam em função da garantia patrimonial do grupo, e não só de determinada empresa.

 

A seguir, Cláudio Godoy explicou e debateu questões a respeito do envolvimento das SPEs nos processos de recuperação judicial, distinguindo SPEs com e sem patrimônio de afetação, limites de garantia do patrimônio afetado. Discorreu ainda a respeito do caráter negocial do processo de recuperação judicial e do ônus dos credores de examinar a viabilidade econômica da empresa recuperanda.

 

Participaram também do evento o desembargador Sérgio Seiji Shimura, coordenador da Área de Direito do Consumidor da EPM; e a juíza Renata Mota Maciel Madeira Dezem, também coordenadora da Área de Direito Empresarial e do curso.

 

RF (texto e fotos)


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